domingo, 20 de maio de 2012

Maiores Jogos da História do Flamengo: 03/12/78 - Flamengo 1 x 0 Vasco




Jogos Inesquecíveis: 03/12/1978 - Flamengo 1 x 0 Vasco

"Em 1978, foi o Flamengo que faturou a Taça Guanabara. A final da Taça Rio foi, novamente, entre os dois rivais, com o Vasco jogando com a vantagem do empate para faturar o segundo turno e forçar a realização de uma final, em dois jogos. O empate por 0 a 0 perdurou até os 45 minutos do segundo tempo, quando um escanteio cobrado por Zico encontrou a cabeça do zagueiro Rondinelli, que entrava correndo pela área por trás da zaga vascaína. Gol do título! Mengão campeão carioca de 1978. Acabava o incômodo jejum de três anos sem um título. Um jogo que ficou marcado na história pelo sofrimento até o último giro do ponteiro do relógio, pela emoção, pelo gol do Deus da Raça". (A NAÇÃO, pg. 122)





Ficha Técnica
03/12/1978 - Flamengo 1 x 0 Vasco
Local: Maracanã, Rio de Janeiro (Público: 120.433 pagantes)
Gol: Rondinelli (41'2T)
Fla: Cantareli, Toninho Baiano, Manguito, Rondinelli e Júnior; Carpegiani, Adílio e Zico; Marcinho, Cléber (Eli Carlos) e Tita (Alberto Leguelé).
Téc: Cláudio Coutinho
Vasco: Emerson Leão, Orlando, Abel Braga, Gaúcho e Marco Antônio; Helinho, Guina e Paulo Roberto; Wilsinho (Paulo César), Roberto Dinamite e Ramón (Paulinho).
Téc: Orlando Fantoni



A História do Jogo

No dia 3 de dezembro de 1978, o Flamengo conquistou um dos títulos de maior importância em sua história do Flamengo. Não foi uma Libertadores ou um Mundial, mas foi uma conquista que abriu portas para estes troféus serem conquistados três anos depois por aquela geração. O zagueiro Rondinelli escorou de cabeça uma cobrança de escanteio de Zico, nos minutos finais do jogo, diante de um Maracanã com público superior a 120 mil torcedores, e consumou a conquista do título do Campeonato Carioca que o Flamengo havia conquistado pela última vez quatro anos antes, o que gerava muitas contestações sobre a real qualidade daquela geração. O gol de cabeça de Rondinelli, o "Deus da Raça", deu ao clube o título do segundo turno e garantiu o troféu do estadual daquele ano, o 18º da história rubro-negra, dado que aquele time já havia vencido o primeiro.

O Flamengo havia perdido a Taça Guanabara (1º turno) de 1976 e a final do 2º turno do Estadual de 1977 para o Vasco, ambas as vezes após decisões por pênaltis. Fora do campo, o time rubro-negro, por estas duas derrotas, não escapava das gozações que insistiam em pregar as pechas de "time sem raça" e "freguês". E o Vasco chegava embalado à final do segundo turno. Apimentando o confronto, o zagueiro vascaíno Abel havia dito durante o campeonato: "Torço para jogar a final contra o Flamengo. É o time que menos nos assusta. Não sei o que é perder para eles há um ano e oito meses".

O Flamengo não vencia ao Vasco desde março de 1977, quando venceu um amistoso por 2 a 1. Eram cinco partidas sem marcar um gol sequer no rival. E o Vasco chegava à última rodada do returno acumulando dez vitórias em dez jogos no turno. Assim, os cruzmaltinos jogavam pelo empate para ficar com o título do segundo turno, e assim forçar uma decisão de campeonato entre Flamengo e Vasco, que neste caso seriam os vencedores de cada turno.

No time rubro-negro, a geração de "pratas da casa", além do próprio Rondinelli, contava com os polivalentes Tita, Adílio e Júnior, que açucaravam um meio de campo bastante técnico formado por Carpegiani e Zico, o craque do time, então com 25 anos, também prata da casa, dono da camisa 10, ídolo da torcida, artilheiro da equipe e ao mesmo tempo armador de toda o dinamismo ofensivo da equipe, aquele que cadenciava o ritmo de ataque do time. Mas Zico estava pressionado também, pois havia perdido o pênalti na decisão contra o Vasco na temporada anterior, não havia tido um desempenho dentro do esperado com a Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1978. Até ele estava precisando de afirmação naquele momento.

No 1º tempo, o Vasco estava mais cauteloso. O técnico Orlando Fantoni armou seu time num 4-2-1-3, com Helinho e Paulo Roberto na contenção e apenas Guina tentando pensar o jogo. Na frente, Roberto Dinamite era a referência, suportado pelas pontas com Wilsinho pela direita e Ramon pela esquerda, que atacavam e voltavam para acompanhar as idas ao ataque de Toninho e Júnior. Precisando da vitória, Cláudio Coutinho escalou seu time num 4-2-2-2. Carpeggiani e Adílio marcavam e davam qualidade para a saída de bola. Zico e Tita armavam o jogo, e Marcinho e Cléber jogavam mais a frente. Desfalcado do artilheiro do campeonato, o centroavante Cláudio Adão, o treinador rubro-negro teve que buscar outras fórmulas para dar ofensividade à sua equipe, a quem só a vitória interessava.

O Flamengo assustou logo aos dois minutos: Marcinho cobrou escanteio e Zico cabeceou para boa defesa de Leão. Aos sete, Guina avançou pela direita e cruzou na segunda trave, onde estava Ramon, tendo o ponta tentado cabecear direto para o gol, ao invés de ter tentado ajeitar para Roberto, que entrava livre pelo meio da área. O time rubro-negro parecia nervoso, errava passes na saída de bola e cometia muitas faltas.

Aos quinze minutos, Zico dividiu com Helinho, caiu, levantou, passou por dois marcadores e bateu firme, e mais uma vez Leão - que ainda não havia sido derrotado uma única vez desde que havia trocado o Palmeiras pelo Vasco - não deu nem rebote. Zico era marcado individualmente pelo volante Helinho, que toda vez que era driblado, cometia a falta e parava a jogada.

Aos vinte e três, Tita roubou a bola de Marco Antônio, passou pelo lateral vascaíno e chutou forte para a área. Gaúcho tentou afastar, pegou na orelha da bola e obrigou Leão a fazer uma grande defesa, de puro reflexo, espalmando a escanteio e evitando um gol contra.

Aos trinta e oito, Marco Antônio fez falta em Marcinho, e só então saiu o primeiro cartão amarelo da partida. O Flamengo seguia pressionando: aos quarenta e quatro Zico teve uma boa chance, pegando um rebote, mas acabou pegando mal e a bola saiu fraca para as mãos de Leão. No minuto seguinte, foi o Vasco quem chegou, Roberto passou por Manguito, mas também bateu fraco e Cantareli defendeu com facilidade.

O Vasco jogava recuado, mas de forma segura, levando a crer que administraria a igualdade no placar e manteria intacta a sina do adversário. E assim, no final de um primeiro tempo muito mais marcado do que jogado, apesar do Flamengo ter sido ligeiramente superior, criando três chances, contra duas do time de São Januário, o empate sem gols era justo. Durante a semana, todos os comentários eram que os dois clubes não iriam abrir mão de obter rendas com duas partidas finais. E após os primeiros quarenta e cinco minutos de jogo, os defensores desta "teoria da conspiração" reverberavam: "eu não falei?".

Na volta para o segundo tempo, o Vasco voltou com uma alteração: Paulinho, vice-artilheiro do time na competição, entrou na vaga de Ramon. E quase que a substituição já deu resultado logo aos três minutos. Wilsinho cruzou da direita e Paulinho desviou com perigo para o gol de Cantareli. O jogo parecia estar mais à feição do time de Fantoni, pois o Flamengo se abria mais, pela obrigação de vencer o jogo, correndo mais riscos e dando mais espaços para os contra-ataques, que passaram a ficar mais perigosos com a presença de Paulinho na linha de ataque vascaína.

Aos vinte e dois minutos, Coutinho buscou renovar o fôlego de seu time, lançando Eli Carlos no lugar de Cléber. Zico passou a jogar então quase como um centroavante, abrindo Marcinho pela direita e Tita pela esquerda. Eli passou a armar o jogo. Cláudio Adão estava fazendo muita falta.

Aos vinte e cinco minutos, Zico tabelou com Adílio, recebeu na frente e chutou para grande defesa de Leão. No rebote, Tita isolou. Era a primeira chance de gol rubro-negra na etapa final. O time rubro-negro a partir de então cresceu no jogo. Aos vinte e nove, novamente Zico apareceu na grande área e foi travado por Abel e, na sobra de bola, Toninho finalizou de primeira com a bola explodindo em Orlando e saindo para escanteio. Percebendo que o rival melhorava no jogo, Orlando Fantoni substituiu o ponta-direita Wilsinho pelo volante Paulo César, fechando-se mais na defesa. Faltavam apenas quatorze minutos para a conquista do segundo turno e o Vasco se precavia.

Aos tinta e quatro minutos, Guina deixou Roberto Dinamite em boas condições, o artilheiro bateu de pé esquerdo e Cantareli mandou para escanteio. Quatro minutos depois, Roberto ganhou de Rondinelli e serviu Paulinho, sozinho na área, que chutou de canela e perdeu a melhor oportunidade do jogo até aquele momento. Quase, muito quase mesmo, o time vascaíno mudou as páginas do livro de história naquele momento.

A resposta rubro-negra foi no minuto seguinte, duas vezes seguidas com Tita; na primeira tendo cortado da esquerda para o meio e batido firme, com Leão dando rebote e a bola sobrando para Marcinho, que cruzou para Tita, que cabeceou, com perigo, para fora.

Três minutos depois, quando o relógio marcava 41 minutos do 2º tempo, aconteceu o lance que ficou marcado para sempre na história do futebol. Júnior cruzou, Marco Antônio estava sozinho, mas mesmo assim se precipitou e mandou a bola para escanteio. Nas palavras de Adílio: "Geralmente era eu quem cobrava o escanteio, mas ali no momento, quem estivesse perto cobraria. Aí é que veio o impulso: o Tchê, um fotógrafo amigo nosso, pegou a bola e jogou para o Zico". O fotógrafo citado por Adílio é Ruben Etchevarria, conhecido como Tchê, uruguaio que acompanhava o cotidiano do Flamengo. A história é lembrada pelo próprio Galinho de Quintino: "Eu estava indo bater o escanteio e o Tchê, fotógrafo uruguaio que fazia todos os churrascos das nossas festas de campeonato, me passou a bola e me falou 'Vai, bate rápido'. Bati, a bola chegou no Rondinelli e ele mandou de cabeça para o gol. Eu sempre digo que me arrepio mais com esse gol dele do que com muitos gols meus".

Zico cobrou o escanteio e Rondinelli entrou pelo meio da área, aproveitou o vacilo de Abel e, agigantado pela magnífica impulsão, e por seu 1,76 metro, testou para o gol de Leão. A descrição pelas palavras do próprio zagueiro Rondinelli: "O Dinamite fala que não, mas ele me abandonou no meio do caminho. São detalhes. Tenho consciência de que dei um vacilo uns três, quatro minutos antes da jogada com ele. O Carpegiani, que era o nosso capitão, falou algo assim: 'Como é que você vai subir pro lance se você deu uma vacilada? Fica lá que você não vai resolver nada na frente'. Eu pensei 'estou há dois tempos tentando evitar gol, quero ajudar a sair daqui com esse time campeão. Vou desobedecer!'. Eu estava com 23 anos, tentando me firmar como titular. Se eu posso ir, eu vou, pela minha intuição. E o Zico sabia da minha intuição, não à toa que eu digo que ele não cruzou a bola, ele alçou. Ele sabia. Com ele alçando a bola, tive toda a possibilidade de cabecear firme. Nesse meio tempo, o Roberto me larga, eu fui em zigue-zague, fugindo, e peguei a bola justamente onde o Zico pôs. Fui tomado por essa luz, entro em êxtase. Cara, o mundo desabou de alegria". A leitura do lance pelo zagueiro vascaíno Abel Braga: "Nem passou nada pela minha cabeça porque a jogada foi muito rápida. Primeiro pela forma que o Zico bateu o escanteio, segundo porque a bola estava nas minhas costas. Para mim, era o Orlando que vinha na bola. Depois, vendo isso tudo, teve o Roberto Dinamite, que acompanhou um determinado momento e depois parou. Acho que ali não dava para o Leão sair. E a cabeceada foi como um chute!". Na visão do jogador que fazia a dupla de zaga com ele, Gaúcho: "Eu estava afastado, bem distante e a bola passou muito alta. Quando eu vi o Rondinelli passando em velocidade por trás do Abel, senti que ele ia pegar impulsão. É daqueles lances que você só reza, para que de repente ele errasse a cabeceada". Explosão no Maracanã! O título rubro-negro estava muito próximo. O jejum, enfim, parecia estar chegando ao fim.

Aos quarenta e quatro minutos, Coutinho reforçou a sua marcação, tirando Tita e colocando Alberto Leguelé. Ansioso, Zico levou cartão amarelo ao isolar uma bola depois da falta marcada. Na sequência, Paulinho ainda teve uma oportunidade e perdeu, chutando para uma segura defesa de Cantareli, sem risco de empate. O fim de jogo, como não poderia deixar de ser naquelas circunstâncias, era tenso e nervoso. Nos acréscimos, Zico e Guina se agrediram e acabaram recebendo, os dois, o cartão vermelho. O jogo ficou então parado por conta da confusão por mais de seis minutos, com direito a invasão do gramado por parte de jornalistas e de sumiço de bolas. Quando o árbitro reiniciou o jogo, não houve tempo para mais nada. Fim de jogo: Mengão campeão!

Nas palavras de Zico: "O gol do Rondinelli, seguido do título, nos deu a confiança que faltava para levar o Flamengo às grandes conquistas". E o zagueiro, herói daquele dia, complementa com sua visão: "Aquele gol foi o divisor de águas para a nossa geração. Se a gente não tivesse conquistado o título, o time provavelmente seria desfeito, ficaria com fama de vice, de perdedor". E complementou: "A partir daquele momento, estava confirmada uma geração que o Flamengo fez em casa. A minha vontade ali, depois do gol, era pular na geral. O banco todo correu na minha direção no pau da bandeira e dei uma cambalhota. Faltavam dois ou três minutos para o jogo acabar, já estava praticamente encerrado. A nação rubro-negra é tão abençoada, que o gol aconteceu debaixo dela. Não poderia ter sido melhor".

Depois da redenção em cima do rival, o time rubro-negro emendou uma sequência de 52 jogos sem perder, a maior invencibilidade do futebol nacional junto com o Botafogo. Ainda se sagrou tricampeão carioca e até 1983 alcançou as maiores façanhas de sua história ao arrebatar três títulos brasileiros, uma Copa Libertadores e o Mundial Interclubes.

Dois dias depois do título de 78, a imprensa do Rio de Janeiro promoveu um encontro na Gávea entre Rondinelli e Agustín Valido, atacante argentino que, assim como o zagueiro, marcou de cabeça contra o Vasco, a minutos do fim, o gol do primeiro tricampeonato carioca rubro-negro. Nas palavras do herói de 1944: "Olha, meu filho, você não imagina a alegria que sinto por estar ao seu lado. Você é tudo o que eu fui para o Flamengo: raça, amor à camisa, paixão, e febre de vitória".








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