domingo, 30 de abril de 2017

Escândalo Maracanã - Engenhão: o passo a passo de toda a podridão!

Excepcional texto de Bruno de Laurentis, no site Mundo Rubro-Negro, sobre o histórico de corrupção por trás do licitação para o Consórcio Maracanã e a Operação Engenhão. Não se pode deixar de notar a preocupação do autor em não concluir o texto, afinal, perante nosso Sistema Judiciário e a Ordem de Advogados do Brasil, há sempre o risco dos corruptos entrarem com processos judiciais contra seus denunciantes. Por isto, com muita inteligência e maestria, o texto do Bruno monta um quebra-cabeça peça a peça, e deixa o leitor unir os fatos. Eis abaixo a integra deste trabalho majestoso:

Às voltas com o Consórcio Maracanã e seus operadores, de ontem e de hoje, o Flamengo encontra-se numa sinuca de bico.

Uma vez com a Arena da Ilha para 20.500 torcedores, o clube não tem hoje uma solução no Rio de Janeiro para jogos que tenham maior demanda que essa totalidade SE mantiver a postura de não mais jogar no Maracanã caso a concessão seja mesmo vendida à Lagardére. E vale lembrar que não são 20.113 a serem vendidos, considerando 10% de visitantes e 10% de gratuidades, mais uns 3% de cortesias. Serão sempre no máximo cerca de 15.300 ingressos à venda que não devem chegar à bilheteria no Brasileiro se o clube fizer a campanha que seu elenco permite fazer e a torcida espera que faça. Muito provavelmente os ingressos usualmente esgotar-se-ão na fase de vendas online apenas para Sócio-Torcedores.

Além disso, fases finais de copas nacionais e internacionais demandam estádios de 40 mil torcedores, além de haver hoje uma proibição para venda de jogos para outras praças no Campeonato Brasileiro, e na Conmebol Libertadores haver restrição de jogos apenas no estado onde reside o clube – para mudança de praça deve-se fazer pedido com dez dias de antecedência à partida e necessidade de aprovação da Conmebol e ainda do adversária a ser enfrentado. Por exemplo, não mais será possível fazer o que fizemos ano passado, quando registramos como campos Volta Redonda, Brasília e Cariacica.

Mas o Flamengo sempre contou com um trunfo na manga: o Engenhão, Estádio Olímpico Nilton Santos, com capacidade para 45.000 torcedores.

Só que a péssima relação entre as diretorias de Flamengo e Botafogo colocaram o Flamengo numa situação em que não deveria estar. E muitos acreditam que essa crise entre os clubes se dá por causa do vídeo do grupo de humor Porta dos Fundos, de nosso VP de Comunicação, filmado na Gávea e com apoio da Adidas; além do caso William Arão, quando Flamengo contratou o volante que não aceitou permanecer em General Severiano, chegando a devolver 400 mil reais ao clube, duas vezes – a segunda judicialmente.

Hoje, sabemos que há mais caroços nesse angu. E como. Não posso fazer juízo de valores ou dizer exatamente o que quero dizer, mas posso apresentar nessa coluna uma sequência de acontecimentos. É o que farei a seguir.

Maracanã e as cartas marcadas
O Flamengo sempre sonhou com a operação do Maracanã, e essa foi a oferta feita a Marcio Braga por Sergio Cabral, ainda em 2007, quando o clube desistiu de participar da licitação de concessão do Engenhão. A informação é de Cesar Maia, ex-prefeito, em entrevista ao Mundo Rubro Negro, confirmada por nosso ex-presidente e tabelião Márcio Braga.

Foi prometido ao clube que ele poderia participar da licitação como poderia ter participado da concessão do Engenhão e, cinco anos depois, o clube viu-se enganado e preterido do processo.


O edital foi feito por uma empresa contratada pelo estado do Rio de Janeiro, uma das que integram o conglomerado de empresas de Eike Batista, hoje preso na Operação Lava-Jato. O Ministério Público mostrou que o edital foi feito na sede da Odebrecht em Botafogo, reunindo a empresa que venceria a licitação fazendo ajustes no edital para que chegassem ao melhor contrato possível para o Consórcio Maracanã, que seria formado por 90% da Odebrecht, 5% da Andrade Gutierrez e 5% do… Eike Batista. Isso mesmo, Eike é dono da empresa que escreveu o Edital de Licitação e é dono da empresa que venceu o edital de licitação. Hoje, estão presos também os donos das duas empreiteiras (Eike Batista foi solto ontem, aliás), que repassariam no futuro sua parte à Odebrecht, hoje única operadora do Consórcio.

Em grampo capturado pela Polícia Federal, pudemos saber quais as reais intenções dos envolvidos. Além deles, quase todos os membros do Tribunal de Contas do Estado também estão presos por receberem propina para aprovação de todas as etapas do processo, com superfaturamento, propinato e cartas marcadas.

A coluna Radar já mostrava que estava tudo encaminhado para Eike e Odebrecht:

De todos os envolvidos na Licitação do Maracanã, poucos são os que ainda não estão livres, e ainda há de respingar no Iphan, que liberou a demolição da cobertura do Maracanã aumentando o valor da obra em mais de 300 milhões de reais, mesmo que a cobertura fosse tombada.

Por essas e outras, a GL Events e a CSM, parceiras do Flamengo na tentativa de adquirir a concessão do Maracanã, agora que a Odebrecht a vende depois de ter todos os seus executivos presos, desistiu do processo. Porque tudo indica que a qualquer momento a licitação possa ser cancelada, uma vez que o Ministério Público prove que o edital da licitação foi feito sob medida para que o grupo ganhasse a concessão.

O Engenhão nunca ofereceu risco
Quando assumiu o estádio em 2007, o Botafogo fez um laudo contestando as condições do estádio, avisando que a cobertura se deslocou mais que o programado, que havia rachaduras, problemas hidráulicos e elétricos por toda parte. A prefeitura fez questão de dizer que não havia problemas estruturais e que os reparos menores poderiam ser feitos.

Em 2010, mediante novo laudo botafoguense, o ex-prefeito Eduardo Paes convocou coletiva para dizer que estádio não corria risco algum:


Em 2012, Botafogo voltou a apresentar laudo e mais uma vez foi ignorado pela prefeitura, que alegava que o Estádio Olímpico João Havelange estava em perfeitas condições.

O plano de sócio-torcedor
Às voltas com as novas administrações, recém-eleitas poucos meses antes no ano de 2013, Flamengo e Fluminense planejavam lançar seus programas de Sócio-Torcedor. O do Flamengo, por exemplo, arrecadou 26,7 milhões de reais para o clube em 2016 com uma média de 59 mil sócios. Agora em 2017 já somos 90 mil e clube deve arrecadar mais de 35 milhões de reais, mais que nosso futuro patrocinador master vai pagar em 2018, a Carabao Energy Drink.

Mas o que o Sócio-Torcedor tem a ver com o caso Engenhão? Veja bem, um plano de Sócio-Torcedor voltado para desconto em ingressos precisa de um sistema de tickets e catracas funcionando em conjunto, e o clube precisava definir um estádio fixo como sua “casa” para lançar o programa, e para também lançar carnês de jogos.

O Flamengo assinou dia 19 de março de 2013, para mandar seus jogos no Engenhão até o final daquela temporada. Sem ter a certeza da utilização do Maracanã – que não tinha mais data certa para inauguração e ficaria nas mãos da CBF e Fifa para a competição de seleções.

Os dirigentes da Gávea decidiram renovar a locação do estádio botafoguense, que vigorou de setembro de 2010 até dezembro de 2012. O contrato assinado entre Botafogo e Flamengo, previa participações em receitas como estacionamento e restaurantes, além de poder realizar ações de marketing no local e implementação do programa de Sócio-Torcedor rubro-negro.


Assim sendo, Botafogo jogava em seu estádio no Engenhão durante o tempo de concessão de 20 anos, o Flamengo e o Fluminense jogariam lá em 2013 e o Vasco jogava em São Januário. Mas aí um problema foi criado para o Governo do vascaíno Sergio Cabral, hoje residente em Bangu…

O dilema de Cabral
O grande problema de Flamengo e Fluminense assinarem com o Botafogo, é que o Edital de Licitação do Maracanã era bem claro, ao estabelecer as cláusulas obrigatórias do Concessionário:

— Parceria com pelo menos dois clubes sob contrato;
— 40 jogos anuais com carga de ingressos de pelo menos 40 mil ingressos

Esses dois itens tornaram-se um problema. Como assinar o edital se Flamengo, Fluminense e Botafogo jogariam no Engenhão e Vasco em São Januário?

Então, oito dias depois de os clubes assinarem com o Estádio Público do Município gerido pelo Botafogo, Eduardo Paes convoca uma coletiva surpresa, após negar por diversas vezes problemas com o estádio e chegar a fazer pouco caso do “risco de cair a cobertura”.


Durante a coletiva, o prefeito avisa que um “novo laudo” indica riscos da cobertura cair com ventos acima de 63 Km/h e fecha o estádio por tempo indeterminado, até que estudassem que medidas tomar.

Curiosamente, essa data coincide com o fim da “garantia” do estádio, período de cinco anos que as empreiteiras envolvidas (Delta, Odebrecht e OAS) deveriam corrigir qualquer problema de construção.

Ainda, Eduardo Paes fez questão de afirmar durante a coletiva que ele não era responsável, nem pela construção, nem pelo fechamento do mesmo, e que o fazia apenas para “proteger” o povo carioca.

Curiosamente, o prefeito é do mesmo partido de Sergio Cabral, o PMDB, e a Odebrecht é uma das principais financiadoras de campanhas de ambos os membros do executivo em questão, Paes e Cabral…


O que veio depois
Depois do fechamento do Engenhão, tivemos uma série de acontecimentos.

Uma semana depois, Flamengo e Fluminense viram-se presos ao Maracanã e assinaram. Fluminense assinou primeiro por 35 anos e Flamengo depois, só que apenas até o fim do ano.


Mais tarde, Flamengo viria a renovar o contrato com alterações, até dezembro de 2015.

O mais curioso, é que o Botafogo se viu obrigado a assinar com o Maracanã. Mas ao contrário do Flamengo, em vez de fazer contrato curto já que em breve teria seu estádio de volta, fez um contrato como o do Fluminense, de 35 anos. E pegou um empréstimo, nunca cobrado pela Odebrecht na assinatura do mesmo.

Só que posteriormente, a Odebrecht acenou com a possibilidade de dividir a gestão do Engenhão com o Botafogo, e o presidente alvinegro não negou a possibilidade do mesmo.


Seria o golpe definitivo da Odebrecht, que viria a controlar Maracanã e Engenhão, praticamente obrigando o Flamengo a fechar com ela ou não ter onde jogar. Posteriormente, Carlos Eduardo Pereira, o presidente do Botafogo, passou a ter uma posição dura comtra o Flamengo pelos motivos que mencionamos no início da coluna. Mas será que aqueles são mesmo os motivos?

Vale dizer que a assinatura do Botafogo era muito valiosa, uma vez que com Botafogo e Fluminense assinados pelos 35 anos da Concessão, empresa cumpria de cara a obrigatoriedade de dois clubes cariocas parceiros sob contrato até o final da concessão.

Só se sabe que a Odebrecht foi obrigada pela prefeitura a reformar o Engenhão, que ficou três anos fechado. Orçamento da obra de “reforço” da cobertura em R$ 100 milhões, foi entregue após as Olimpíadas com prestação de gastos de apenas R$ 55 milhões.


Talvez a única obra olímpica sem sobrepreço e estouro de orçamento, pelo contrário, economia de 45%. E olha que ainda fizeram obras de adaptação no Engenhão para receber os Jogos Olímpicos.

Curiosamente, as empresas ainda estão na justiça tentando ressarcimento do pagamento, alegando que a garantia do estádio já estava vencida. Podem recuperar o valor.

Mas foi um custo pequeno para quem conseguiu, com o fechamento do Engenhão, assinar com Flamengo, Fluminense e Botafogo, garantindo assim que jamais teria sua concessão cassada.

Necessário lembrar que a cidade do Rio de Janeiro passou entre 2013 e 2016 por vendavais monstruosos, acima de 100Km/h e nunca tivemos notícia de abalo no Engenhão, como nos exemplos abaixo:




A conclusão é sua, leitor
Mais alguém aí enxergou o que aconteceu? O colunista prefere não desenhar, mas deixou transcritos todos os fatos na ordem em que aconteceram, com fontes e informações. Faça você seu julgamento.

• Cabral promete Maracanã ao Fla que desiste do Engenhão em 2007
• Botafogo compete sozinho pelo Engenhão e vence
• Botafogo apresenta laudo com problemas no Engenhão
• Começa a reforma do Maracanã no Governo Cabral
• Cabral tem suas campanhas com financiamento maciço de empreiteiras
• Empresa do Eike escreve o Edital
• Grampo mostra que Eike e Odebrecht mantinham reuniões
• Sai o Edital que exige parceria com dois clubes
• Dois clubes grandes do Rio não tem estádio
• Eike concorre com outra de suas empresas em sociedade com Odebrecht
• Eike e Odebrecht vencem o Edital
• Começa a Construção do Maracanã
• Flamengo e Fluminense assinam com Botafogo por 3 anos
• Botafogo apresenta novo laudo com problemas do Engenhão
• Eduardo Paes convoca coletiva para dizer que Engenhão não tem problemas
• Maracanã atrasa
• Flamengo e Fluminense tem novos presidentes
• Novos Presidentes querem lançar programas de Sócio-Torcedores
• Maracanã atrasa
• Flamengo e Fluminense assinam com Botafogo por mais um ano
• Oito dias depois, Eduardo Paes fecha o Engenhão usando laudo
• Eduardo Paes convoca coletiva e diz que há risco de cair
• Oito dias depois, Flamengo e Fluminense assinam com Maracanã
• Botafogo também assina com Maracanã
• Botafogo pega empréstimo com Maracanã
• Flamengo renova com Maracanã
• Engenhão fica três anos em obra
• Odebrecht paga obra do Engenhão que custa 45% a menos que previsto
• Presidente do Botafogo alimenta animosidades contra o Flamengo
• Presidente do Botafogo assume que Odebrecht pode dividir gestão do Engenhão
• Presidente do Botafogo proíbe Flamengo de jogar no Engenhão
• Flamengo viaja por todo o Brasil jogando em Arenas “Elefantes Brancos”
• Flamengo negocia pontualmente jogos com Maracanã sem opções no Rio
• Marcelo Odebrecht é preso
• Sergio Cabral é preso
• Secretário de Obras do Estado é preso
• Eike Batista é preso
• Membros do TCE são presos
• Todos por negociarem propinas e/ou superfaturamento nas obras
• E tem gente aí que ainda acredita que a Cobertura do Engenhão ia cair.


Saudações Rubro-Negras!
Bruno de Laurentis







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