terça-feira, 29 de agosto de 2017

Primeira Liga, o grande erro de estratégia. A revolução morreu!

A Primeira Liga é uma lamentável perda de oportunidade para realização de uma revolução no futebol brasileiro.

Antes de dar minha opinião, para me ajudar a concluir, vou utilizar a opinião de outros em artigos que li recentemente, e com as quais concordo integralmente, por isso as reproduzo.

Concordo com as palavras de Anderson Alves, em artigo publicado em 14/02/2017 no site Coluna do Flamengo: "pessoalmente eu não tenho nada contra o Carioca. Já me diverti muito torcendo para o time contra os pequenos do Rio, que estão se tornando cada vez menores, e vibrei com alguns títulos no passado. Acontece que com a chegada do Brasileiro, os inúmeros erros de arbitragem, as muitas intromissões de STJD, os campos ridículos em que jogamos, entre muitos outros “poréns”, cada vez mais nos fazem sonhar: "E se os clubes organizassem a sua própria competição?".

Como bem lembrou o artigo "Primeira Liga vai dar liga?", publicado por Thiago Nascimento em 15/02/2017 no site FlaHoje, eis abaixo as cinco razões originais que levaram à formação da Primeira Liga. E concordo com o Thiago quando ele disse no mesmo artigo: "A alternativa aos estaduais foi criada. Estaduais esses que na minha opinião são chatos, têm um nível técnico baixíssimo e possuem pouca atratividade perante os torcedores dos clubes que participam". As justificativas para a criação da Primeira Liga:

• Gestão do campeonato organizado verdadeiramente pelos clubes.

• Captação de patrocínios pelos próprios participantes.

• Venda dos direitos de transmissão do campeonato diretamente pelos clubes à TV que pretende transmitir à competição.

• Transparência na gestão para todos os envolvidos/interessados pelo campeonato.

• Igualdade nas decisões administrativas. Todos os participantes possuem voz ativa e democrática dentro da organização/promoção do evento. 

Os pontos acima já deixam a opinião suficientemente clara, mas para reforçar ainda mais e não deixar qualquer margem a interpretações divergentes, reforço com as palavras de Vinny Dunga, no artigo "O início do fim da FERJ", publicado em 3 de março no site Coluna do Flamengo: "Com essa fórmula de disputa que é uma verdadeira piada, com times de tão baixo nível técnico, com palcos caindo aos pedaços, com jogos onde não se sabe o dia, o local, o horário, é óbvio que o Campeonato Carioca está fadado ao fracasso, ano após ano, sucessivamente. O pensamento provinciano, e amador que o futebol do Rio de Janeiro vem sendo gerido, somado a falta de conscientização de alguns torcedores, levou a esse estopim".

Com oposição ferrenha de Vasco e Botafogo, e indiferença total dos clubes de São Paulo, cuja opção óbvia é de ignorar tudo que não seja os elos obscuros entre a Federação Paulista e a CBF de Marco Polo Del Nero, numa atitude bastante condizente com o Umbigocentrismo Histórico da nação paulista, eis que no fim de 2015 alguns grandes clubes conseguiram o que em muito tempo não se conseguia no futebol brasileiro, unir-se contra as Federações Estaduais.

Para lembrar o quão complexa é conseguir uma união assim, basta lembrar que a última tentativa similar havia acontecido em 1993, quando se tentou a criação da Liga Rio-Minas, propondo um campeonato alternativo e mais rentável e lucrativo, com 8 clubes, reunindo Flamengo, Fluminense, Botafogo, Atlético Mineiro, Cruzeiro, América Mineiro e outros dois por se conseguir adesão (o Vasco de Eurico Miranda era oposição ferrenha). Na época, não se conseguiu a adesão de um volume mínimo de clubes suficiente para alavancar um torneio. Eis que desta vez se tinha volume (quantidade de clubes) e se tinha vários estados. Tinha-se tudo para uma revolução. É só olhar a força dos escudos que se uniram e fica ainda mais clara a perda de oportunidade para a realização de uma revolução no futebol brasileiro.


Em 10/09/2015, em reunião na sede do Flamengo, foi oficialmente fundada a Liga Sul-Minas-Rio, formada por 14 clubes. A 1ª edição, em 2016, reuniu 12 clubes: Flamengo, Fluminense, Atlético Mineiro, Cruzeiro, Grêmio, Internacional, Coritiba, Atlético Paranaense, Criciúma, Avaí, Figueirense e América Mineiro. Dos fundadores, dois não participaram da primeira edição: Chapecoense e Joinville. Em 2016, outros 7 clubes aderiram ao movimento: Tupi, Brasil de Pelotas, Paraná Clube, Londrina, Atlético Goianiense, Luverdense e Ceará. Dois, porém, por divergência quanto à divisão das cotas de televisionamento, afastaram-se: Coritiba e Atlético Paranaense. Ainda assim, a 2ª edição, em 2017, foi confirmada com 16 participantes, e mais datas no calendário frente à primeira edição. Participariam doze dos fundadores, sem os dois paranaenses divergentes, mais Londrina, Paraná, Brasil de Pelotas e Ceará.

O motivo para a saída de Coritiba e Atlético Paranaense foi muito pela distribuição das cotas de TV (queriam distribuição mais igualitária), mas foi muito também pela correta leitura estratégica dos dois de que a fórmula para 2017 fugia ao objetivo principal que levou estes clubes a se unirem um ano antes: atacar o modelo de Estaduais das Federações.




A CBF dificultou, com uma ajuda da Conmebol, inflando ainda mais o já inflado calendário, dificultando novas datas. A Rede Globo "comprou" os clubes com mais dinheiro pelos Estaduais. Atlético Paranaense e Coritiba ficaram isolados. E a fórmula de disputa da Primeira Liga 2017 foi assim esvaziada. O torneio perdeu completamente sua razão de ser. A revolução estava morta. E quando os próprios clubes envolvidos fizeram o que o comprimido calendário exigia - colocar times reservas para jogar a Primeira Liga - o tiro derradeiro estava dado. A revolução estava morta.

Em matéria publicada no jornal Lance! em 10/02/2017 ("Primeira Liga: críticas e ‘sabotagem’ dos próprios participantes"), as palavras do presidente do Grêmio resumiam isto com palavras mais polidas e politicamente corretas: "A Primeira Liga é uma causa. Acho que está um pouco prejudicada. Como conceito, de auto-organização, perdeu um pouco o conteúdo por culpa dos próprios clubes. Grêmio faz uma culpa. Lamentavelmente, muitos interesses estão se sobrepondo a isso. Mas vamos tentando passar por cima. Temos que refazer o debate".

Quando se propõe, como já foi mencionado, que a edição de 2018 se proporá a transformar a Primeira Liga num Torneio de Verão, ao estilo da fracassada Florida Cup nos EUA, aí então é que a morte definitiva está declarada. Ridículo!

O diagnóstico foi bem sintetizado por Anderson Alves, no artigo já citado e publicado em 14/02/2017 no site Coluna do Flamengo: "Infelizmente, como uma competição mais próxima de independente, a Liga incomoda. Ela não tem a força que precisava. Com a saída de Atlético Paranaense e Coritiba, então, seu poder se torna incompatível com suas aspirações. Metade dos clubes grandes estão na competição. Ainda assim, o técnico de um sai do jogo falando que a competição não tem sentido, embora reclame de gol anulado; o time de outro leva todo o elenco reserva, até ao treinador; uma federação aliada marca jogos dos seus filiados para horas antes de partidas pela Liga… Uma avacalhação total".

Com os contratos de TV assinados da forma que foram assinados, e com validade pelos próximos três anos, fica quase impossível reverter a falência do modelo. Perdeu-se uma excepcional oportunidade de fazer a revolução. A Primeira Liga deveria ter vendido seus direitos para o triênio 2017-2019 para o Esporte Interativo, que certamente teria pago mais do que a Rede Globo pagou. As datas do terneio deveriam ter sido propositalmente sobrepostas a datas de jogos pelo Estaduais contra pequenos, com a final marcada para o mesmo dia que a final do Estadual. Ainda faltaria uma peça. Naturalmente o Sindicato e os Defensores dos Direitos Humanos se levantariam contra a jornada de trabalho dos jogadores envolvidos em múltiplas competições. Um documento conjunto assinado por todos os clubes garantindo que nenhum jogador disputaria partidas num intervalo inferior ao exigido pela lei, calaria o burburinho, e formalizaria o uso de reservas nos jogos contra pequenos pelos Estaduais. Mais de 50% dos clubes da Série A do Campeonato Brasileiro estariam unidos neste propósito, CBF e Rede Globo não teriam como radicalizar. Em 1987 a adesão de 16 clubes fez a Copa União e realizou a última revolução pela qual passou o futebol brasileiro. Agora tinha-se mais de 16 fortes agremiações. Era mais do que suficiente para ridicularizar a oposição de Vasco e Botafogo, e se sobrepor aos interesses e a indiferença da Federação Paulista e dos grandes clubes de São Paulo. Tinha-se tudo para a Revolução. A oportunidade está perdida!



Veja também: Como o Status Quo matou a Revolução no Futebol Brasileiro


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